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terça-feira, 12 de dezembro de 2017

Aconteceu realmente em um 25 de dezembro*



9 julho 2003 :: Corriere della Sera, de Vittorio Messori



O dia de Nossa Senhora da Assunção não está tão distante e eu devo já fazer reparações. Acontece, de fato, que em um momento de mau humor – e exatamente neste jornal – se tenha desejado que a Igreja decida de fazer uma mudança no calendário: transferir para o 15 de agosto a celebração de 25 de dezembro. Um natal no deserto das férias de verão (Ntd.: na Europa, o mês de agosto coincide com o verão e com o período de férias), dizia, nos livraria das insuportáveis luminárias, dos exagerados trenós com renas e papais-noéis, até mesmo das saudações e dos presentes. Quando todos estiverem fora (Ntd.: por motivo das viagens de férias), quando as cidades estiverem vazias, para quem – e para onde – enviar cartões e entregar pacotes com fitas? Não são os próprios bispos a gritar contra aquele tipo de orgia consumista à qual reduziram os nossos Natais? E agora, desloquemos os comerciantes, transfiramos tudo para o 15 de agosto. Isso, observava, não parece impossível: de fato, não foi a necessidade histórica, foi a Igreja a escolher o 25 de dezembro para contrastar e substituir as festas pagãs nos dias de solstício de inverno. O nascimento de Cristo no lugar do renascimento do Sol Invictus. No início, portanto, houve uma decisão pastoral que pode ser mudada, variando segundo as necessidades.

Uma provocação, obviamente, que se baseava naquilo que é (ou melhor, era) pacificamente admitido por todos os estudiosos: a colocação litúrgica do Natal é uma escolha arbitrária, sem nenhuma relação com a data do nascimento de Jesus, que ninguém seria capaz de determinar. Ainda assim, parece que os experts tenham errado; e eu, obviamente, com eles. Na realidade hoje, também graças aos documentos de Qumran, temos a capacidade de estabelecer a data com precisão: Jesus nasceu exatamente em um 25 de dezembro. Uma descoberta verdadeiramente extraordinária e que não se pode suspeitar que seja por objetivos apologéticos cristãos, visto que a devemos a um professor, hebreu, da Universidade de Jerusalém. 

Tentemos compreender o mecanismo, que é complexo e ao mesmo tempo fascinante. Se Jesus nasceu em um 25 de dezembro, a concepção virginal aconteceu, obviamente, 9 meses antes. E, de fato, os calendários cristãos colocam em 25 de março a anunciação a Maria feita pelo anjo Gabriel. Mas, sabemos pelo mesmo evangelho de Lucas que exatamente seis meses antes Isabel tinha concebido o precursor, João, que será chamado o Batista. A Igreja católica não possui uma festa litúrgica para aquela concepção, enquanto as antigas Igrejas do Oriente a celebram solenemente entre o 23 e o 25 de setembro. E, portanto, seis meses antes da Anunciação a Maria. Uma sucessão de datas lógicas, mas baseada em tradições inverificáveis, não sobre eventos localizáveis no tempo. Assim acreditavam todos, até o tempo muito recente. Na realidade, parece exatamente que não seja assim.

De fato, é exatamente da concepção de João que devemos partir. O Evangelho de Lucas se abre com a história do casal idoso, Zacarias e Isabel, já resignado pela esterilidade, uma das piores desgraças em Israel. Zacarias pertencia à casta sacerdotal e, um dia que era de serviço no Templo de Jerusalém, teve uma visão de Gabriel (o mesmo anjo que seis meses depois se apresentará a Maria, em Nazaré) que lhe anunciava que, mesmo com a idade avançada, ele e a mulher teriam um filho. Deveriam chamá-lo de João e que ele seria “grande diante do Senhor”.

Lucas tem o cuidado de mostrar com precisão que Zacarias pertencia à classe sacerdotal de Abias e que quando houve a aparição “exercia as funções de sacerdote, na ordem de sua classe”. De fato, aqueles que no antigo Israel pertenciam à casta sacerdotal eram divididos em 24 classes que, alternando-se em ordem imutável, deviam prestar serviço litúrgico no templo por uma semana, duas vezes por ano. Sabemos que a classe de Zacarias, a de Abias, era a oitava, na relação oficial. Mas, quando ocorriam os seus turnos de serviço? Ninguém sabia. Então, utilizando também pesquisas feitas por outros especialistas e trabalhando, sobretudo, em textos encontrados na biblioteca essênia de Qumran, eis que o enigma foi violado pelo professor Shemarjahu Talmon que, como dizia, ensina na Universidade Hebraica de Jerusalém. O estudioso conseguiu determinar em que ordem cronológica se alternavam as 24 classes sacerdotais. A de Abias prestava serviço litúrgico no Templo duas vezes por ano, como as outras, e uma destas vezes era na última semana de setembro. Portanto, era provável a tradição dos cristãos orientais que coloca entre o 23 e o 25 de setembro o anúncio a Zacarias. Mas esta probabilidade se aproximou da certeza porque, estimulados pela descoberta do professor Talmon, os estudiosos reconstruíram a “série” daquela tradição, chegando à conclusão que ela provinha diretamente da Igreja primitiva, judeu-cristã, de Jerusalém. Uma memória tão antiga quanto tenaz, aquela das Igrejas do Oriente, como confirmada em muitos outros casos.  Eis, portanto, que o que parecia mítico assume, de repente, nova verossimilhança. Uma corrente de eventos que se estende por 15 meses: em setembro, o anúncio a Zacarias e no dia seguinte a concepção de João; em março, seis meses depois, o anúncio a Maria; em junho, três meses depois, o nascimento de João; seis meses depois, o nascimento de Jesus. Com este último evento chegamos exatamente ao 25 de dezembro. Dia que, portanto, não foi fixado por acaso.

Mas sim, parece exatamente que é impossível propor o Natal em 15 de agosto. Disto farei, portanto, reparação, ao invés de humilhado, bastante emocionado: depois de tantos séculos de pesquisa feroz, os evangelhos não cessam de reservar surpresas. Detalhes aparentemente inúteis (o que nos importava que Zacarias pertencesse à classe sacerdotal de Abias? Nenhum exegeta prestava atenção a isso) mostram de repente a sua razão de ser, o seu caráter de sinal de uma verdade escondida, mas precisa. Apesar de tudo, a aventura cristã continua. 

*título não original inserido pelo autor do site


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