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sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

“Por que tão poucas mulheres se dizem feministas?”


Leone Grotti 

A Bbc não consegue compreender porque em tempos do #MeToo as mulheres não se reconhecem na causa feminista. Nós o explicamos com um pequeno bestiário



Mas como pode? “Milhões de mulheres” marcharam contra Donald Trump em 2017; mais de 80 atrizes tiveram a coragem de denunciar os abusos sexuais de Harvey Weinstein; meio milhão de usuários compartilharam a hashtag #MeToo no dia em que foi lançada no Twitter; atrizes e estrelas internacionais abraçaram publicamente a batalha sobre igualdade de gênero; movimentos como #everydaysexism alcançaram o centro das atenções; tudo isto e muito mais aconteceu no espaço de poucos anos e ainda assim poucas mulheres “se dizem feministas”?

O ESPANTO DA BBC

A Bbc não consegue entender e confiou à professora do King’s College de Londres, Christina Scharff, um estudo. Segunda diversas pesquisas realizadas pela YouGov e outros institutos que realizam pesquisas de opinião, somente 34% das mulheres do Reino Unido se definem feministas. Em outros países a situação não é melhor: na Suécia, pátria dos direitos das mulheres, o feminismo atrai 40% das mulheres, 33% na França, 29% na Noruega, 22% na Dinamarca, 17% na Finlândia e somente 8% na Alemanha. 

O fato é ainda mais desconcertante, continua Scharff, se consideramos que mais de 80% das mulheres sustentam que “homens e mulheres são iguais”, muitas outras concordam em condenar o sexismo, ainda assim mais se abaixa o nível de instrução das pessoas pesquisadas, maior é a tendência a rejeitar a etiqueta feminista, que, porém “defende” todas estas causas. 

A culpa seria dos velhos estereótipos que “associam o termo ‘feminismo’ com o ódio contra os homens, com o ser lésbica e a falta de feminilidade”. Mas Scharff não consegue compreender como possam sobreviver no século XXI prejuízos assim. Como os jornalistas da Bbc, igualmente a tantos pesquisadores e professores universitários, parecem viver mais no Twitter que no mundo real, procuremos recordar alguns atraentes modelos que a causa feminista ofereceu às mulheres ocidentais nos últimos anos e algumas soluções que  têm avançado para corrigir a sociedade patriarcal machista.   

BRINCAR DE INCENDIAR AS IGREJAS 

Um grupo famosíssimo de feministas, exaltado pela mídia, Le Femen, se orgulha de manifestar seios descobertos em toda parte do mundo para denunciar o “patriarcado” e tem como líder uma mulher que aceitaria “doações também de satanás para difundir o feminismo”.  

Outros exemplos de coletivos feministas pacatos e pacíficos podem ser encontrados na Argentina, onde todos os anos no dia 8 de março tentam incendiar as igrejas do país e se brinca encenando Nossa Senhora abortando; ou mesmo na Espanha, onde as feministas distribuem caixas de fósforo com a inscrição: “A única Igreja que ilumina é aquela que queima. Contribua conosco!”.

“CURAR” OS HOMENS

Na Suécia foi introduzida uma  lei “para mudar a mentalidade de cada homem e rapaz” que impõe de pedir à outra parte, melhor se por escrito, o explícito consenso para a relação sexual. Sem o qual, qualquer um pode ser acusado formalmente de estupro. Ainda na Suécia um professor de neurofisiologia foi colocado sob investigação, acusado de “antifeminismo”, por ter dito na aula que do ponto de vista biológico “homens e mulheres são diferentes”.

Permanecendo ainda neste paraíso do feminismo, eis outras batalhas apoiadas pelas nossas heroínas: lei para modificar a expressão “mulher grávida” para “pessoa grávida” para não discriminar os transexuais; creches onde para eliminar o “sexismo” se dirigem às crianças com pronomes neutros; cursos para curar os homens da “masculinidade tóxica”. E paremos aqui para não discriminar os outros países.

A ESCRITURA INCLUSIVA

Na França foi inventada a “escritura inclusiva” para mudar as regras da gramática e da linguagem com a finalidade de garantir finalmente “a igualdade entre homens e mulheres”. Uma norma desta nova língua prevê de decompor o plural, que utiliza o masculino também para designar aqueles grupos dentro dos quais existem seja homens que mulheres, e inserir depois da raiz da palavra o sufixo masculino e o feminino separados por um ponto de meia altura. É mais fácil escrevê-lo que descrevê-lo: para indicar “os candidatos à presidência da República” será preciso escrever “os candidat·as·os”. A mesma coisa foi proposta na Espanha.

Ainda do outro lado dos Alpes, uma defensora do feminismo, Titiou Lecoq, se orgulhava de não ter levado seu filho ao otorrino por alguns dias porque “quem deveria fazer isso deveria ser seu companheiro”. O menino, por causa disso, teve um tímpano perfurado, mas em compensação “ele agora compreendeu”.

 #METOO, SUTIÃS E SEX TOY

Na Itália, o jornal Repubblica patrocina a causa feminista falando de sutiãs sem bojo, que talvez agradem menos aos homens, mas também “a perspectiva com a qual se olha um produto como o íntimo feminino é filho de uma consciência diferente da parte das mulheres do próprio modo de ocupar um espaço na sociedade”. Culturalmente relevante é também a campanha feminista em favor do  sex toy.

Não falamos do #MeToo, que promoveu a lei em todo o Ocidente: primum sputtanare, deinde verificare (ndt.: primeiro caluniar, depois verificar). Quantos homens foram acusados de assédios, perderam trabalho e família, e depois foram absolvidos de qualquer acusação, quando pelo twitter os textos se tornaram um verdadeiro tribunal? Como sugeriu Alain Finkielkraut o objetivo da hiperbólica campanha social sobre assédios é “o desaparecimento do homem”.

HOMENS NÃO, MUÇULMANOS SIM

O feminismo é também famoso por usar dois pesos e duas medidas: o homem é sempre culpado, salvo quando é de fé islâmica. O grupo Le Femen jamais protestou em uma mesquita; quando as mulheres francesas do quarteirão Chapelle-Pajol de Paris denunciaram que “os homens nos insultam se usamos saia, não podemos mais sair de casa”, a ultra-feminista Marlène Schiappa, ministro da igualdade de gênero, a mesma que patrocinou a escritura inclusiva, ficou calada porque os homens em questão eram imigrantes e muçulmanos. O símbolo desses descuidos é o silêncio sobre os fatos turbulentos da noite de fim de ano em Colônia.

O FEMINISMO SÉRIO

Poderíamos citar muitos outros exemplos (isso lhe diz alguma coisa Laura Boldrini?), mas é melhor parar aqui. Estamos felizes pela Bbc ter dado um mergulho no mundo real através de pesquisas. O que escapa à análise de Scharff e de tantas outras professoras é que o feminismo teve, e ainda tem, um papel importante e, possui grandes pensadoras, que souberam  refletir profundamente sobre o tema da diferença sexual: Luisa MuraroMarina TerragniSylviane Agacinski, somente para citar alguns nomes. Infelizmente muito frequentemente as suas reflexões são ofuscadas por quem reduziu o feminismo a um circo hipócrita e à superficialidade denunciados em um magistral artigo para o jornal Tempi pela filósofa francesa Bérénice Levet:

“O feminismo é uma ideologia que vê a relação entre homem e mulher como uma relação de força e de poder, onde o homem representa o predador e a mulher a sua presa. Mas, não é de fato assim, e é a nossa experiência a dizer isso. (...) O movimento #MeToo me perturba, mas o discurso vitimista, ainda mais se veiculado por grandes atrizes americanas em visibilidade, mulheres que ocupam lugares de destaque, não engana a ninguém (...) porque a essência da mulher não é de fato a de ser uma vítima e a história das mulheres não pode ser reduzida a isto. (...) O feminismo é exatamente uma escola de estupidez, reduz as obras do nosso patrimônio literário, figurativo, musical ao seu horizonte restrito”.
 


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