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terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Geração iPhone: uma catástrofe antropológica



Benedetta Frigerio 

 

Obcecados  pelo “eu gosto”, assustados pelo estar isolados mas somente sobre o social (não importa se são também assim na vida), gostariam de livrar-se da sua “terceira mão”, o smartphone, mas basta que se deparem com a realidade, se assustam e preferem retornar para os seus quartos confortáveis, onde os pais os deixam viver (pensando que seja um lugar mais seguro que a rua) colados na internet e de onde têm acesso a um mundo sob medida, capaz de satisfazer  imediatamente, sem sacrifícios, todas as suas pulsões e desejos. Assim, incapazes de relacionamentos, de enfrentar os problemas, são deprimidos, não são rebeldes e até mesmo desinteressados da sexualidade carnal. Em poucas palavras, são súditos perfeitos.

Não são hipóteses abstratas, mas fruto de pesquisas sobre milhões de adolescentes efetuadas sobretudo nos Estados Unidos, onde “os filhos do smartphone”, nascidos entre 1995 e 2005, possuem aparência completamente diferente da geração precedente, com uma lacuna geracional de amplidão sem precedentes na história (a documentação mais ampla se encontra no livro de Jean M. Twenge "iGen", ou seja , "Geração iPhone").  

Basta pensar que um dos estudos mais recentes, da State University de San Diego, que coloca em relação os sintomas depressivos e o risco de suicídios com o uso dos dispositivos eletrônicos por parte de 133 mil adolescentes, deu como resultado um aumento da depressão entre 2012 e 2015 entre as moças que passaram mais horas do dia diante dos aparelhos eletrônicos (são, sobretudo as mulheres que usam o Facebook e Instagram): a chaga cresceu somente em 3 anos em 58 por cento. Não somente, o uso de internet por cinco ou mais horas durante o dia está correlacionado a um incremento da depressão conexa ao risco de suicídio em 71 por cento. Pelo contrário, como explicam os pesquisadores da Florida State University, entre os adolescentes e as pessoas que vivem uma vida social e de relacionamentos concretos, mesmo praticando esporte e atividades ao ar livre, o percentual dos sintomas de depressão decresce amplamente.

É dito também que os estudos comparativos da iPhone Generation e daquela que a precede,  classes sociais e situações familiares e acadêmicas idênticas, evidenciam  que não é a depressão devida ao background pessoal a empurrar os adolescentes para a alienação das mídias sociais. Pelo contrário, é o próprio uso das mídias a gerar determinados mecanismos que se instauram na mente e no corpo de quem as usa, expondo-se a uma vida virtual onde todos parecem felizes e belos, onde às vezes ficam encantados com os vídeos dementes e repetitivos e com imagens que satisfazem continuamente a pessoa que os observa gerando dependência.

Não se pense que o fenômeno se verifique somente além do oceano, porque o alarme está crescendo também na Itália. Não é por acaso que os nossos médicos mostram exatamente a mesma coisa. Em 30 de dezembro passado, Augusto Biasini, do hospital Bufalini de Cesena, confirmou que “vemos também nós, em medida sempre maior, as dependências do celular. Falo de adolescentes colados ao display dia e noite. Cuidamos de meninos de 10 a 12 anos acompanhados no ambulatório pelos pais: não conseguiam mais separar-se dos seus aparelhos”.

Mas de quem é a culpa? Dos celulares? Bem, a fotografia realista e deprimente de Biasini é mais ampla: “Basta ver na pizzaria durante a noite; ele e ela à mesa, os dois a pressionar as teclas do telefone, e assim também as crianças preocupadas em mandar mensagens, ninguém se fala”. Como se dissessem que o problema é certamente a tecnologia, mas antes ainda os adultos que abusam destes meios e que permitem às crianças e adolescentes de viver colados na pequena tela, que segue todos até mesmo no banheiro (as pesquisas dizem que os jovens não conseguem adormecer se o celular não estiver próximo do travesseiro deles a não ser que entrem em crise de abstinência). Exatamente como acontece a um dependente químico com as substâncias tóxicas. 

Não se trata de um exagero, pois o próprio inventor do iPhone, Steve Jobs, que intencionalmente ou não escolheu como símbolo da sua empresa exatamente uma maça mordida (agora constantemente a nossa disposição), impedia seus filhos de usar a tecnologia a não ser em casos estritamente necessários, mas também o ex-presidente do Facebook, Chamath Palihapitiya,  explicando que se sentia culpado, confessou: “Criamos um sistema de gratificação a curto prazo de like e de feedback guiado pela dopamina, que está destruindo o modo normal com o qual a sociedade funciona... isto que digo não é um problema somente americano...tem a ver com todo o mundo”. Não por acaso, esclareceu “que usava o Facebook o menos possível” e que aos seus filhos “não é permitido usar esta nojeira”. 

Mas o que torna a tecnologia uma droga perigosa, que aflige pela primeira vez também as crianças com danos irreparáveis no cérebro, o descreve Simon Sinek, conhecido consultor de leadership e management, muito requisitado pelas empresas americanas que sofrem os efeitos perdidos desta geração frágil. “As redes sociais são um fator de geração de dependência. A interação com as redes sociais ou com os telefones torna felizes por causa da liberação de dopamina. Quando se recebe uma mensagem, a pessoa se sente feliz porque o seu corpo libera dopamina. O mesmo acontece quando recebemos like em uma das nossas postagens, e mais like recebemos, mais nos sentimos felizes e, portanto maior é a liberação de dopamina. 

A dopamina é o neurotransmissor que tem funções específicas de controle sobre as sensações de prazer, de recompensa, sobre a capacidade de atenção, e assim por diante. Toda vez que o cérebro é estimulado por fatores externos de prazer ou de recompensa (como os like no Facebook, ou uma refeição agradável ou pela atividade sexual satisfatória) a dopamina é liberada. A dopamina é liberada pelo organismo também quando fumamos, bebemos ou jogamos, ou até mesmo quando fazemos coisas com alto risco de dependência. Eis porque somos tão dependentes das tecnologias. Porque nos permitem de liberar dopamina e, portanto de regular o nosso mecanismo de sensação do prazer. Mais dopamina é liberada, mais prazer; mais se experimenta prazer, mais dopamina vem liberada: é portanto um espiral infinito. A tecnologia e o uso das mídias sociais implica esta troca neurológica, que é por si mesma potencialmente geradora de dependência... Portanto os Millennials (ou seja, o iPhone generation, ndr) são deixados à mercê de um uso descontrolado de tecnologias que criam complexas formas de dependência e que os fazem fugir da realidade. E este ponto está estreitamente conexo com o aspecto da impaciência”.

As consequências disto, porém, não são somente a impaciência e a depressão que nasce da incapacidade de suportar frustrações, mas algo que se refere à antropologia humana a 360 graus. Biasini continua recordando que estes “dependentes” não somente são “mais lentos, depressivos, vulneráveis psicologicamente”, mas são “como estranhos também para os seus próprios pais”. São “sedentários e gordos, sempre mais lento na corrida... se cansam no esforço de socialização. O número dos rapazes que mantêm o hábito de sair com os amigos caiu a 40 por cento... são menos interessados em cortejar e em relacionar-se com o outro sexo. São também pouco interessados em sair, um em cada quatro no final dos estudos não possuem ainda a carteira de motorista”.

Destacando que os principais responsáveis desta praga são os educadores e a família que protege imoderadamente os filhos dos problemas do mundo real, Sinek prossegue procurando soluções dado que "no trabalho, na sala de espera do médico, no trem, usamos continuamente o celular sem interagir”, enquanto “a confiança entre as pessoas  se cria nos tempos mortos e não imediatamente”. A principal via de saída está, portanto na redução do uso dos aparelhos eletrônicos e por isso “não devemos permitir o uso dos celulares nas reuniões... quando saio para jantar com meus amigos deixamos o celular em casa... é como para os alcoólatras, o motivo pelo qual retiras de casa o álcool é que não somos bastante fortes, mas se removes a tentação é tudo mais fácil... nenhum de nós deveria levar o telefone para a cama, deveríamos carregá-lo durante o dia... se te acordas de noite não consegues dormir e buscas o telefone para olhar, o que é pior”. 

De fato, agradando ou não, conclui, “se não tens o telefone podes também desfrutar do mundo e é assim que chegam as ideias, as ideias chegam quando a mente divaga e te vem uma ideia, esta é inovação, mas nos estamos privando de todos estes pequenos momentos... temos a responsabilidade de reparar este dano, de ajudar a esta geração a ter confiança, a aprender a paciência, as habilidades sociais a encontrar o equilíbrio entre a vida e a tecnologia”. A alternativa é deixar que cresçam súditos dependentes de um poder que, em troca de prazeres instantâneos, de comodidade e de aparente bem-estar, limpa a humanidade deles, os seus desejos mais profundos e portanto a liberdade que possuem.

 
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