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quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Arqueologia: O anel de Pilatos, o homem que crucificou o Rei dos Judeus



A inscrição impressa em um anel de bronze com sigilo, encontrado há 50 anos durante escavações arqueológicas no local do Herodion, a poucos quilômetros de Belém, foi recentemente decifrada pelos estudiosos, que nele identificaram um nome significativo: Pilatos.



A inscrição impressa em um anel de bronze com sigilo, encontrado há 50 anos durante escavações arqueológicas no local do Herodion, a poucos quilômetros de Belém, foi recentemente decifrada pelos estudiosos, que nele identificaram um nome significativo: Pilatos. O anel foi encontrado, junto a milhares de outras descobertas que remontam ao I século, graças às escavações feitas nos anos 1968-69 pelo professor Gideon Foerster da Universidade Hebraica de Jerusalém, realizados em vista da abertura do Herodion aos visitantes. O Herodion é a colina sobre a qual Herodes, o Grande, fez construir um palácio-fortaleza no final do I século a.C. que foi depois destruído pelos Romanos por volta do ano 71 d.C.; depois da primeira guerra judaica.

A atual equipe que trabalha no sítio arqueológico, guiada por Roi Porath, também eles da Universidade Hebraica, conseguiu discernir, depois de ter cuidadosamente polido o anel e graças ao uso de uma especial foto-câmera colocada a disposição pelos trabalhadores da Autoridade israelense para a Antiguidade, o nome grego impresso no anel e formado pelas letras «ΠΙΛΑΤΟ», equivalente exatamente a “Pilatos”. Os detalhes da pesquisa foram publicados em um artigo no Israel Exploration Journal (vol. 68/2). A escrita circunda a imagem do que parece um recipiente para vinho. Depois de decifrar o nome os pesquisadores o relacionaram a Pôncio Pilatos do qual falam os quatro Evangelhos, onde é mencionado como o governador da Judéia que consentiu, mesmo relutando, na crucificação de Jesus. Um nome que nós cristãos repetimos toda vez que pronunciamos o Credo, recordando que Nosso Senhor padeceu “sob Pôncio Pilatos”. 

Além dos quatro evangelistas, Pilatos é mencionado nos escritos dos outros autores a ele contemporâneos, ou seja, o historiador de origem hebraica Flávio José (37-100 d.C.) e o erudito Filón de Alexandria (20 a.C.-45 d.C.), e em um texto de Tácito (55-120 d.C.) que se remete a 116 aproximadamente. A história o indica a nós como o quinto governador da Judéia romana, que governou entre o 26 e o 36. Não se conhecem outros personagens da época que tenham o seu mesmo nome, que como explicou o professor Danny Schwartz era mais que uma raridade em Israel: “Não conheço nenhum outro Pilatos do período e o anel mostra que era uma pessoa de status e riqueza”, disse Schwartz, citado pelo jornal israelense Haaretz.

Para os estudiosos, além do mais, um anel deste tipo revela o status dos membros da cavalaria romana do tempo, da qual o mesmo Pilatos pertencia. O seu nome foi encontrado pelo professor Foerster nos anos sessenta também sobre uma pedra do Herodion, que depois da morte de Herodes continuou a servir como base de funcionários romanos e é, portanto, verossímil, que também Pilatos se serviu dela como um tipo de quartel general. Retornando ao anel com o sigilo, os pesquisadores consideram que possa ter sido usado por Pilatos no seu trabalho quotidiano e, portanto, poderia ter portado no dedo quando dava o seu via livre, precedido do gesto de lavar as próprias mãos, quando na crucificação de Jesus. Pouco antes, refere são João Evangelista, o governador romano teve o famoso diálogo com Jesus, que lhe disse ter vindo ao mundo “para dar testemunho da verdade. Aquele que é da verdade, escuta a minha voz”. E Pilatos tinha depois perguntado: “O que é a verdade?” (Quid est veritas? Curiosamente, esta frase latina em anagrama contém já em si a resposta...).



NÃO SOMENTE INRI. PILATOS E A INSCRIÇÃO SOBRE A CRUZ

Esta interessante pesquisa contemporânea nos dá a deixa para recordar outro fato que se refere a Pilatos e a Jesus, relativamente pouco percebido, especialmente se considerado no seu alcance mais amplo e revelador.  Sabemos que sobre a santa Cruz o político romano tinha mandado colocar a inscrição – o assim chamado titulus crucis – com o motivo da condenação de Cristo: Iesus Nazarenus [1] Rex Iudaeorum (“Jesus nazareno, o rei dos Judeus”), cujas iniciais nos remetem à célebre sigla INRI. A inscrição, todavia, não era somente em latim. São João Evangelista, autor do quarto e último Evangelho, nos informa que a inscrição era em hebraico, latim e grego. Um detalhe irrelevante? Absolutamente não. Para compreender o porquê, façamos um passo atrás na Escritura.

Na teofania da sarça ardente, narrada no livro do Êxodo, Deus se revela a Moisés ordenando-o de retornar ao Egito para libertar o seu povo, Israel. Quando Moisés, perguntando em que modo os Israelitas lhe dariam crédito, pede a Deus de manifestar-lhe o seu Nome, escuta a resposta: “Eu sou aquele que Sou!”. E depois: “Dirás aos Israelitas: Eu-Sou me mandou a vós” (Ex 3,14). O sagrado tetragrama corresponde ao Nome divino, que muitos hebreus não ousam pronunciar e substituem com o termo Adonai (Senhor), é YHWH. Retornemos à narração do Evangelho. No pleno da sua atividade pública, enquanto revela a sua consubstancialidade ao Pai, Jesus faz uma profecia aos Judeus que têm dificuldade de recohecê-Lo: “Quando elevardes o Filho do homem, então conhecereis que Eu Sou” (Jo 8,28), onde elevação indica a sua crucificação. Mas, em que modo esta profecia se liga ao titulus crucis?

Sempre João, no mesmo texto em que nos informa da inscrição realizada em três línguas, diz que “muitos judeus leram esta inscrição, porque o lugar onde Jesus foi crucificado era próximo à cidade”. Por causa desse título, os chefes dos sacerdotes dos Judeus protestaram com Pilatos; “Não escreva: O rei dos Judeus, mas: Ele disse: Eu sou o rei dos Judeus”. Certo, se pode pensar que já por si mesma a expressão rei dos Judeus incomodasse a quem não tinha aceitado Jesus Cristo, mas há muito mais: recordemos que – quando Nosso Senhor foi conduzido ao sinédrio – o sumo sacerdote rasgou as vestes, acusando-O de blasfêmia, somente depois que Jesus tinha confirmado ser o Filho de Deus.  Era esta, de fato, a verdadeira inconcebível “culpa” de Jesus para os seus carnífices, ser homem e “fazer-se” Deus. 

Definitivamente: sabemos pela inscrição em latim, mas como era escrita em hebraico? O escritor Henri Tisot (1937-2011) se dirigiu a diferentes rabinos para saber qual fosse a exata transcrição em hebraico de “Jesus nazareno, rei dos Judeus” e descobriu que as letras correspondentes deviam ser «שוע הנוצרי ומלך היהודים», as quais – transliteradas, vocalizadas e tendo presente a leitura da direita para a esquerda – nos dão como resultado: Yeshua Hanotsri Wemelek Hayehudim. As iniciais não são outra coisa que o tetragrama sacro: YHWH. Ou seja, esse é o Nome de Deus revelando o Ser eterno e perfeito: Eu-Sou. A profecia de Jesus se tinha cumprido. 

Os Judeus que protestaram com Pilatos viram, portanto, improvisamente diante dos próprios olhos – o modo mais impensável – a Verdade encarnada, o Deus feito homem, que tinham rejeitado e colocado na cruz. Eis porque se revela em todo o seu significado a inscrição composta por Pilatos e com ela a réplica do governador, ainda referida por São João evangelista, diante do pedido feito pelos Judeus: “O que escrevi, escrevi” (Jo 19,22). Como uma sentença, um sigilo que nos recorda Quem é o Menino que festejamos o Natal e veio em meio a nós para oferecer-nos a salvação.


[1] "Nazarinus", segundo o fragmento de tábua em Roma na basílica de Santa Cruz de Jerusalém e que corresponderia à forma correta do latim do I século.

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Anagrama:

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