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quarta-feira, 23 de maio de 2018

O CASAMENTO DO ANO


O casamento real marca o declínio da monarquia inglesa



O Royal Wedding (Casamento Real, ndt.) do Príncipe Harry marcou o fim do que restava ainda da velha Inglaterra. A Monarquia inglesa, assim como a tínhamos conhecido durante séculos, está se esgotando. Meghan interpretou perfeitamente este papel, aquele da moça moderna, emancipada, progressista. No máximo, o que se destaca da nova esposa é a sua passagem com desenvoltura através das várias experiências religiosas.



A Grã-Bretanha, como é conhecida, é o último Reino que poderíamos definir Ancient Regime (antigo regime, ndt.): uma monarquia hereditária, nenhuma constituição, nenhum código de direito civil. Em compensação, costumes e uma tradição tão dinâmica que não se compreende mais o que se conserva e se transmite.


O Casamento Real do Príncipe Harry, o temor da Casa de Windsor, o ex “wild child” (menino problema, ndt.) como era chamado, com as suas brincadeiras às vezes de péssimo gosto, como quando se vestiu de nazista e marchou, talvez tenha marcado o fim do que restava da velha Inglaterra. A Monarquia inglesa, assim como a conhecemos por séculos, está acabando.

Ainda que nas semanas anteriores a Mídia britânica tivesse enormemente enfatizado algumas características da esposa, como o fato de ter sangue afro-americano, de ser fortemente comprometida em questões sociais, de ser feminista, e sobretudo de ser divorciada, a cerimônia que aconteceu no antigo castelo de Windsor, o castelo cujo nome há cem anos se tornou o nome artificial da Família Real, assustada – com o início da Grande Guerra – com o verdadeiro sobrenome alemão de Sachsen-Coburg und Gotha, superou todas as previsões.

Diante de uma plateia onde se destacavam nomes como Elton John, David Beckham e George Clooney, e onde se notava a ausência do Primeiro Ministro Theresa May, os dois jovens se uniram em matrimônio com toda a pompa que semelhante cerimônia requer. Mas além dos altos uniformes, os chapéus surreais e a pompa da Capela de St. George, no Royal Wedding, percebe-se a New Society (nova sociedade, ndt.), liquida e colorida. 

O sermão – longuíssimo – que acompanhou o rito foi confiado ao reverendo Michael Bruce Curry, primata da Igreja Episcopal (ou seja, anglicana) dos Estados Unidos. O prelado de Chicago – afro-americano – começou com uma citação de Martin Luther King, um nome que provavelmente em Windsor jamais tinha sido pronunciado. O sermão foi no mais sincero estilo afro-americano: ampla gesticulação, passionalidade, expressões coloridas. O reverendo Curry, que é autor de uma publicação intitulada Crazy Christians, cristãos loucos, é conhecido nos Estados Unidos pela sua veemente oposição a Donald Trump, e o âmbito pastoral em que dá o melhor de si é aquele das questões sociais e da imigração.

Certamente foram estes os motivos que levaram a esposa a querer que fosse ele nesta cerimônia.

No final do sermão, quase a selar ulteriormente este clima “easy” (agradável, ndt.), eis um coro espiritual a entoar a música Stand By me, um velho grande sucesso pop do cantor afro-americano Ben King que, porém, se tornou célebre sobretudo pela versão de John Lennon. Teria sido por isto, ou pela presença de muitos atores, visto que Meghan Markle foi atriz antes de se tornar namorada real, que a certo ponto se esperava disso a chegada de da atriz do filme “Sister Act” (Mudança de hábito, ndt.). No final, o canto com toda força do God save the Queen (Deus salve a Rainha, Hino nacional britânico, ndt.) levou ao invés a congregação de uma Herlem virtual (Harlem é um bairro de Manhattan na cidade de Nova Iorque, conhecido por ser um grande centro cultural e comercial dos afro-americanos. https://pt.wikipedia.org/wiki/Harlem, ndt.) à velha Inglaterra.

O todo deu um sentido de artificialidade impressionante: mais uma versão oferecida pela Mídia da fábula do Príncipe encantado que casa com a Cinderela. Mesmo se – neste caso – uma Cinderela pertencente a uma minoria étnica. O máximo para uma sociedade multirracial, multicultural, multireligiosa. Meghan interpretou com perfeição este papel, o da moça moderna, emancipada, progressista, orgulhosa da sua pele “escura”, um fato, no entanto, não muito óbvio na bela atriz californiana. No máximo, aquilo que se destaca da nova esposa é o seu percurso com desenvoltura através das várias formas religiosas. Nasceu protestante, tinha frequentado uma das melhores escolas católicas de Los Angeles, tinha casado com um judeu em seu primeiro casamento civil, e enfim, se tornou anglicana em vista do matrimônio. Por outro lado, o que importa a fé? Aquilo que importa é o orgulho étnico, talvez também um pouco de nacionalismo americano importado para a Corte do Buckingham Palace, e tanto espírito da pós-modernidade, aquela que iniciou exatamente na Califórnia no ano de 68, os filhos das flores (se refere à cultura hippie, na qual as pessoas se vestiam com roupas trazendo detalhes de flores, ndt.), o descrédito da família, a hostilidade para com as instituições vistas como repressivas, a vitalidade da juventude.

As colunas sociais terão muito a contar em torno deste Casamento Real, entretanto, a New Society deu hoje um grande passo adiante.

Fonte:
 


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